A Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso) lançou a nova Diretriz Brasileira para o Tratamento Farmacológico da Obesidade, documento que atualiza a conduta de médicos e gestores de saúde diante de um dos principais desafios de saúde pública no Brasil e no mundo.
O novo material apresenta 35 recomendações que reforçam a obesidade como uma doença crônica, que exige acompanhamento contínuo e abordagem personalizada. O foco, segundo a Abeso, não é mais apenas a perda de peso, mas sim a promoção da saúde, da funcionalidade e da qualidade de vida, com metas realistas e sustentáveis.
“É uma mudança de paradigma. Agora buscamos metas possíveis, como a redução de pelo menos 10% do peso corporal, com ênfase na melhora de doenças associadas como diabetes, hipertensão e apneia do sono”, explica o endocrinologista Bruno Halpern, vice-presidente da Abeso.
Uso de medicamentos aliado a mudanças de estilo de vida
A diretriz enfatiza que o uso de medicamentos deve sempre vir acompanhado de mudanças no estilo de vida, como alimentação equilibrada e prática de atividade física. A medicação é indicada, preferencialmente, para pessoas com IMC acima de 30 ou acima de 27 com comorbidades, como diabetes, hipertensão ou doenças cardiovasculares.
Entretanto, a orientação agora é mais flexível: em decisão compartilhada com o paciente, o uso dos remédios pode ser iniciado antes das mudanças no estilo de vida, especialmente nos casos de obesidade grave ou dificuldade de adesão.
“Deixamos de focar exclusivamente no IMC. Hoje levamos em conta medidas de adiposidade corporal e o impacto das medicações combinadas ao estilo de vida”, afirma o endocrinologista Fernando Gerchman, que coordenou a elaboração do documento.
Novos medicamentos e critérios de avaliação
Desde a última diretriz, em 2016, novos medicamentos foram aprovados no Brasil, como liraglutida (Saxenda), naltrexona com bupropiona (Contrave) e semaglutida (Wegovy) — este último, também conhecido por seu uso como Ozempic, mas com dose específica para obesidade. A tirzepatida, conhecida como Monjauro, também deve ganhar espaço.
Essas medicações foram categorizadas na diretriz de acordo com a eficácia, segurança e duração do tratamento, incluindo até o uso off-label (quando o medicamento não é aprovado especificamente para obesidade, mas apresenta resultados positivos).
“O uso deve ser sempre individualizado, levando em conta histórico médico, comorbidades, tolerância, custo e acesso”, destaca o médico Marcio Mancini, coordenador do Departamento de Farmacoterapia da Abeso.
Abordagem personalizada e contínua
A diretriz recomenda que o tratamento seja contínuo, com reavaliação periódica. Ela também orienta que a decisão sobre o tipo de intervenção leve em consideração o perfil alimentar, genético, psicológico e social do paciente. Essa personalização melhora a adesão e os resultados.
“Classificar pacientes com base em comportamentos alimentares nos permite oferecer terapias mais direcionadas e eficazes”, complementa Gerchman.
Além disso, o novo documento inclui grupos específicos que demandam atenção diferenciada, como:
- Idosos com sarcopenia (perda de massa muscular)
- Pacientes com obesidade e câncer
- Pessoas com insuficiência cardíaca ou osteoartrose
- Indivíduos com doenças hepáticas relacionadas ao excesso de peso
Nestes casos, o tratamento da obesidade pode não apenas melhorar a qualidade de vida, como também potencializar outras terapias e prevenir complicações.
O que muda com a nova diretriz:
- ✅ Meta clínica realista: perda de ao menos 10% do peso corporal, com foco na saúde e na qualidade de vida;
- ✅ Critérios além do IMC: passam a ser considerados a circunferência da cintura e a relação cintura/altura;
- ✅ Valorização da decisão compartilhada: o paciente participa ativamente das escolhas terapêuticas;
- ✅ Contraindicação de fórmulas perigosas: como hormônios e diuréticos sem respaldo científico;
- ✅ Reconhecimento da obesidade como doença crônica, com necessidade de tratamento contínuo.
A diretriz foi elaborada com base nas melhores evidências científicas disponíveis e contou com a participação de 15 sociedades médicas brasileiras. Segundo a Abeso, o documento é uma ferramenta essencial para garantir que o tratamento da obesidade no país seja mais eficaz, seguro e centrado no paciente.