O Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (HC-UFG), sob a administração da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), realizou na última terça-feira (18/03) uma cirurgia inédita na América Latina. O procedimento, que envolve estimulação cerebral profunda bilateral do núcleo accumbens, visa tratar a obesidade mórbida (grau III) por meio de intervenção no cérebro do paciente.
O núcleo accumbens, região do cérebro associada a sentimentos de recompensa, prazer, vícios e outros comportamentos, foi o foco da cirurgia. O neurocirurgião Osvaldo Vilela, do HC-UFG, explica que a obesidade, muitas vezes provocada por compulsão, está relacionada a esses circuitos cerebrais. “A ideia foi atuar diretamente nesses centros de prazer e recompensa para tentar controlar a compulsão alimentar”, afirmou.
É importante destacar que o procedimento faz parte de um projeto de pesquisa, cujo objetivo é avaliar a eficácia da cirurgia e as melhores técnicas para sua realização. Como o tratamento ainda é experimental, ele não está disponível no Sistema Único de Saúde (SUS).
Primeiro Paciente Submetido à Cirurgia
O primeiro paciente a ser submetido à cirurgia foi Ivan dos Santos Araújo, de 38 anos e 183 quilos, natural de Goiânia. Ivan compartilhou sua trajetória com a obesidade, que começou aos nove anos e se agravou após um acidente em 2015, que limitou sua capacidade de se exercitar. “A obesidade interfere em todos os aspectos da vida, desde caminhar até realizar atividades cotidianas. Fiquei receoso no início, mas agora estou confiante no sucesso da cirurgia e com grandes expectativas para melhorar minha saúde física e mental”, disse o paciente.
Parceria Internacional e Pesquisa Colaborativa
A cirurgia é resultado de uma parceria entre o HC-UFG e a Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos. A colaboração envolveu reuniões entre as equipes para definir as melhores estratégias para alcançar o núcleo accumbens e implantar os eletrodos necessários para a estimulação cerebral. “A Universidade da Pensilvânia, uma das mais renomadas do mundo, tem um grupo de pesquisadores que está desenvolvendo um projeto semelhante. Resolvemos trabalhar juntos para compartilhar conhecimento e experiência”, explicou o neurocirurgião Osvaldo Vilela.
O Projeto e a Abordagem Inovadora
O projeto de pesquisa sobre estimulação cerebral para o tratamento da obesidade foi iniciado em 2017 por uma equipe de pesquisadores do HC e da UFG. O foco é utilizar eletrodos implantados nos dois lados do cérebro para tratar pacientes com obesidade mórbida que não respondem a tratamentos convencionais, como dieta, psicoterapia e exercícios físicos. O neurocirurgião Osvaldo Vilela explicou que a obesidade é uma doença complexa, relacionada à compulsão alimentar, o que difere de simples questões fisiológicas de fome e saciedade. Por isso, o foco foi agir nos centros de prazer e recompensa, e não apenas nos centros de fome e saciedade.
O procedimento foi aprovado pelo Comitê Nacional de Ética e Pesquisa em 2018 e, com a liberação de recursos, o HC-UFG deu início às cirurgias.
O Núcleo Accumbens e o Processo de Implantação
O núcleo accumbens é dividido em duas áreas: o Core, responsável por funções motoras, e o Shell, que influencia comportamentos emocionais e vícios. O eletrodo será implantado na área periférica (Shell) para atuar nas funções límbicas. Após a cirurgia, os pacientes serão monitorados por dois anos. A equipe de neurocirurgia testará diferentes configurações do eletrodo para determinar qual abordagem é mais eficaz. O processo incluirá uma fase de “duplo cego”, onde o paciente não saberá qual configuração está sendo utilizada, para garantir a objetividade dos resultados.
Fonte: Agência Brasil