Criança com autismo é mantida em hospital psiquiátrico por 45 anos na Inglaterra

Reprodução: Patsie Staite/ BBC

Uma mulher com autismo e dificuldades de aprendizagem passou 45 anos internada em um hospital psiquiátrico na Inglaterra, desde os sete anos de idade, vivendo em segregação por mais de 20 anos. O caso de Kasibba, que não se comunica verbalmente, reflete uma falha sistêmica em relação ao tratamento de pessoas com deficiência no país.

Kasibba, nome dado pelas autoridades locais para proteger sua identidade, acredita-se ser natural de Serra Leoa. Ela foi provavelmente traficada para a Inglaterra quando tinha apenas cinco anos, passando um período em um orfanato até ser transferida para um hospital de longa permanência aos sete anos.

A psicóloga clínica Patsie Staite, que trabalhou por nove anos para promover a liberação de Kasibba, compartilhou o processo com o programa de rádio File on 4 Investigates, da BBC. Ela revelou que a paciente foi diagnosticada como “perigosa” e “capaz de arrancar olhos” — uma acusação originada de um incidente ocorrido quando Kasibba tinha 19 anos. Em um momento de grande angústia após um alarme de incêndio, ela se envolveu em uma altercação com outra paciente, resultando em um pequeno corte. No entanto, essa situação foi mal interpretada, perpetuando a ideia de que Kasibba era violenta.

O Departamento de Saúde e Assistência Social da Inglaterra criticou o fato de que tantas pessoas com autismo e dificuldades de aprendizagem ainda permanecem internadas em hospitais psiquiátricos, e destacou que reformas na Lei de Saúde Mental deveriam prevenir internações inadequadas no futuro. Atualmente, mais de 2.000 pessoas com autismo e dificuldades de aprendizagem, incluindo cerca de 200 crianças, estão reclusas em hospitais psiquiátricos no país.

O caso de Kasibba se junta a outros expostos em uma investigação da BBC em 2011, quando abusos a pessoas com dificuldades de aprendizagem no hospital Winterbourne View, em Bristol, foram revelados. Desde então, o governo prometeu transferir aqueles sem transtornos mentais para cuidados comunitários, mas os progressos têm sido lentos.

Nos últimos meses, o NHS England anunciou um plano para reduzir a dependência de internações psiquiátricas, com uma meta de diminuir pelo menos 10% até 2025. Dan Scorer, chefe de políticas da Mencap, criticou a meta como insuficiente, destacando que muitas pessoas continuam em situação de sofrimento, sem receber o apoio adequado na comunidade.

Patsie Staite soube da situação de Kasibba em 2013, quando fazia uma revisão do atendimento da paciente. Ela ficou chocada ao ver como a mulher estava sendo tratada, confinada em um ambiente isolado, onde passava mais de 23 horas por dia em reclusão. Em uma visita ao hospital, Staite viu um buraco na cerca do anexo onde Kasibba vivia, que permitia que ela observasse o mundo externo.

A história de Kasibba é marcada por sofrimento e mal-entendidos. Sua internação foi motivada por uma série de falhas no sistema de saúde, incluindo um erro de avaliação de suas condições e a falta de alternativas para seu cuidado. Staite apresentou um relatório detalhado, afirmando que Kasibba não tinha transtornos mentais e que seria seguro retirá-la do hospital e integrá-la à comunidade.

Em 2016, um grupo de profissionais de saúde, apelidado de “comitê de fuga”, começou a trabalhar para libertar Kasibba. Após anos de esforços, finalmente, em 2022, a Corte de Proteção autorizou sua saída do hospital. Kasibba agora vive na comunidade com o apoio de profissionais de saúde, que a ajudam a se comunicar por gestos e toques. Ela é descrita como uma pessoa com grande senso de humor e muito carinho pelos outros.

O Projeto de Lei de Saúde Mental atualmente em tramitação no Parlamento britânico visa garantir que pessoas com autismo ou dificuldades de aprendizagem não sejam mais internadas em hospitais psiquiátricos, desde que não tenham uma condição de saúde mental. Contudo, o governo ainda não adotou mudanças, alegando que precisa garantir que há apoio suficiente na comunidade antes de implementar a legislação.

O conselho de Camden, responsável pela colocação de Kasibba no hospital, chamou a situação de uma “tragédia” e se desculpou pessoalmente pelo sofrimento que ela passou. A instituição onde ela foi mantida não se pronunciou publicamente sobre os erros cometidos, mas afirmou que os serviços prestados foram de alta qualidade, segundo a Comissão de Qualidade do Atendimento (CQC).

Kasibba, agora, vive uma nova fase em sua vida, livre do confinamento, mostrando que é possível, com o devido apoio, reverter anos de segregação e proporcionar uma vida mais digna e com melhores condições para pessoas com autismo e outras deficiências.

Fonte: BBC

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