O rim é o órgão com maior fila de transplantes no Brasil. Apesar de ser um dos poucos que podem ser doados por um doador vivo, a espera por um órgão compatível se arrasta para milhares de pacientes. Atualmente, 42 mil pessoas aguardam um transplante renal, o que representa a maior parte dos 45,3 mil pacientes na fila por um órgão no país.
O aumento expressivo da demanda tem relação direta com a alta incidência de doenças que comprometem a função dos rins. Desde 2014, os casos de doença renal crônica cresceram 57,6%, e hoje, cerca de 155 mil pessoas dependem da diálise para sobreviver.
O que explica o crescimento da fila?
A doença renal crônica é irreversível e exige tratamentos contínuos, como a hemodiálise, para substituir a função dos rins. O transplante é a melhor alternativa, mas apenas 5% dos pacientes conseguem realizá-lo.
A maioria precisa enfrentar longas sessões de diálise, que impactam profundamente a qualidade de vida. Somente em 2023, cerca de 40 mil brasileiros iniciaram o tratamento. Segundo especialistas, a grande demanda por transplantes tem relação com doenças como diabetes e hipertensão, que estão entre as principais causas de insuficiência renal no país.
Recorde de transplantes, mas fila ainda cresce
O Brasil registrou um número recorde de transplantes renais em 2024, com 6,3 mil procedimentos realizados. Apesar do avanço, a quantidade ainda é insuficiente para reduzir significativamente a fila de espera.
Entre os pacientes que aguardam um rim está o motorista Wagner Ganzaroli, de 53 anos. Diagnosticado com rins policísticos, ele descobriu a doença ao tentar doar um órgão para sua mãe, que sofre da mesma condição. Em 2023, começou a apresentar sintomas como vômitos constantes, inicialmente atribuídos à dengue. Após ser internado na UTI, veio o diagnóstico: falência renal.
Desde então, Wagner faz hemodiálise três vezes por semana e sonha com um transplante que lhe permita recuperar sua rotina. “Estar preso à máquina é difícil. O transplante representaria uma liberdade”, desabafa.
A doação de rim e os desafios da compatibilidade
Apesar da possibilidade de doação por um doador vivo, a maioria dos transplantes ocorre com órgãos de pacientes falecidos. Além disso, o processo enfrenta barreiras, como a baixa conscientização sobre a importância da doação de órgãos e as regras de compatibilidade.
A legislação brasileira permite que apenas parentes de primeiro e segundo grau doem um rim, o que reduz as chances de encontrar um doador adequado. Em alguns casos, cônjuges também podem doar, mas a compatibilidade é rara. A restrição visa evitar o comércio ilegal de órgãos.
Camilo Lopes, de 39 anos, foi um dos pacientes que conseguiu um transplante, mas enfrentou um revés. Após receber um rim da irmã e retomar sua vida, em 2021, uma infecção assintomática de Covid-19 afetou o órgão transplantado, levando-o novamente à falência renal. “Só quem já passou por isso sabe como é difícil”, conta.
Diálise peritoneal: alternativa pouco utilizada no Brasil
Desde então, Camilo está novamente na fila e optou por um tratamento menos invasivo: a diálise peritoneal. Diferente da hemodiálise, esse método permite que o paciente realize o procedimento em casa, sem precisar frequentar o hospital com tanta frequência. O processo, feito por meio de um catéter abdominal, dura cerca de 15 minutos e proporciona mais liberdade ao paciente.
Apesar das vantagens, a diálise peritoneal ainda é pouco adotada no Brasil. Apenas 3,4% dos pacientes renais fazem uso desse método, embora especialistas estimem que até 30% poderiam se beneficiar se houvesse mais informação sobre a alternativa.
Mesmo com os avanços na diálise, o transplante continua sendo a solução definitiva para a doença renal crônica. Com um órgão compatível, a qualidade de vida melhora significativamente, e um paciente pode viver até 20 anos com um rim transplantado. No entanto, o número reduzido de doadores segue sendo um dos maiores desafios para quem aguarda na fila.