O hábito de passar horas em frente às telas pode estar trazendo mais consequências do que se imaginava. Um novo estudo da Universidade de São Paulo (USP) está investigando se a rotina intensa de jogadores eletrônicos — os chamados gamers — pode estar associada ao desenvolvimento de bruxismo, distúrbio caracterizado por apertar ou ranger os dentes de forma involuntária.
A pesquisa, conduzida pela Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto (Forp/USP), foca em adultos acima dos 18 anos que praticam e-sports ou têm alta exposição aos games. Os dados preliminares já indicam uma possível ligação entre a prática e o aumento dos casos de bruxismo.
“Os jogadores estão constantemente expostos a fatores como estresse competitivo, longas jornadas diante de telas, privação de sono e uso de estimulantes, que podem contribuir para o surgimento do bruxismo”, explica Caio Sberni Pinheiro de Souza, mestrando e um dos responsáveis pelo estudo.
O que é bruxismo e por que ele preocupa?
O bruxismo é um distúrbio comum que atinge cerca de 40% da população brasileira, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Ele pode ocorrer durante o dia ou à noite e, na maioria das vezes, acontece de maneira inconsciente.
Os principais sintomas incluem:
- Dores de cabeça e na mandíbula
- Desgaste dental
- Sensação de travamento na articulação da mandíbula
- Dores no rosto ou nos ouvidos ao acordar
O bruxismo pode estar relacionado a fatores como ansiedade, estresse crônico, distúrbios do sono (como apneia) e até refluxo gástrico. Em quadros mais graves, ele pode causar fraturas nos dentes ou problemas na articulação temporomandibular (ATM).
Games, estresse e o sono em risco
Um dos pontos levantados pelo estudo da USP é o impacto que os jogos eletrônicos podem ter sobre o sono e o equilíbrio emocional dos jogadores. A exposição prolongada à luz azul das telas, por exemplo, afeta a produção de melatonina, o hormônio responsável por regular o sono.
“A luz azul estimula o cérebro e reduz a qualidade do sono. Para quem já tem predisposição ao bruxismo, isso pode agravar o problema”, afirma um especialista
Além disso, os próprios jogos podem gerar estímulos emocionais intensos, aumentando a ansiedade e a tensão muscular — fatores diretamente ligados ao bruxismo.
Como funciona o estudo?
A pesquisa da Forp/USP segue em andamento e ainda busca voluntários. Os interessados devem preencher um questionário online, com duração média de 10 minutos, que avalia hábitos de rotina, sintomas físicos, saúde emocional e qualidade do sono.
Se os resultados apontarem indícios de bruxismo (mais de 60% de respostas positivas), o participante pode ser convidado para uma segunda fase do estudo, com monitoramento diário por aplicativo durante sete dias.
A proposta é mapear comportamentos e desenvolver estratégias que possam prevenir e tratar o problema. “O bruxismo não é apenas um problema odontológico. Ele também sinaliza sobrecarga emocional e tensão acumulada”, reforça Caio.
Dá para prevenir?
Sim. Além do acompanhamento com dentistas especializados, algumas medidas simples ajudam a evitar o agravamento do distúrbio:
- Melhorar a qualidade do sono
- Reduzir o tempo de exposição às telas antes de dormir
- Praticar atividades relaxantes (como meditação ou exercícios respiratórios)
- Buscar apoio psicológico para lidar com estresse e ansiedade
Em casos mais severos, o uso de placas oclusais (para evitar o desgaste dos dentes) e até aplicações de toxina botulínica podem ser indicadas.
“Prevenção passa por autoconhecimento e mudanças de hábitos. O gamer precisa entender os limites do corpo e saber que o cuidado com a saúde vai além da performance nos jogos”, conclui o especialista